terça-feira, 30 de outubro de 2007

PEGA LADRÃO, PEGA LADRÃO

Hoje pela manhã, após ler o jornal matinal, fiquei, além de pasmada, bastante triste, porque me dei conta, finalmente, que estamos vivendo em meio a uma guerra civil não declarada e sem previsão de fim. Fico me perguntando: onde esse mundo vai parar? Nós só vemos e lemos sobre violência... Marido mata esposa para evitar nova gravidez. Neto mata avós durante ‘alucinação’. Adolescentes são mortos por dívidas de drogas. Policiais escondem fardas para não terem suas famílias ameaçadas. Adolescentes são detidos com armas brancas (facas e estiletes) e drogas em festa de abertura de jogos estudantis. E é daí para pior... Por isso, compartilho do sentimento da escritora do texto que a seguir lhes apresento. Também tenho saudades da época em que as pessoas enfrentavam os ladrões juntos e sem medo. Quando será que o povo brasileiro vai deixar de ser tão passivo e condescendente?


Por Sandra Falcone (advogada e escritora)
Corri pra sacada, curiosa.
Que maravilha, meu Deus, um sujeito dando no pé e três outros atrás.
Pega ladrão, pega ladrão.
Soou como uma sinfonia! Uma luz divina vinda do espaço sideral iluminou aquela noite, até então escura e sombria.
Nem tudo está perdido, a esperança até existe. Comprovada ali, naquele momento, ao som daquele estribilho mágico.
Pega ladrão, pega padrão.
E mais do que o estribilho a correria, sim, a correria.
Quantos anos faz que não ouço alguém TER A CORAGEM DE GRITAR PEGA LADRÃO? Quantos infinitos anos não vejo alguém correr atrás do ladrão e NÃO DO LADRÃO?
AH! Se eu não estivesse no oitavo andar e com o elevador enguiçado, me juntava no coro e na correria.
Porque momentos assim, especiais, inusitados devem ser curtidos, saboreados, enaltecidos.
Fiquei ali, em estado de graça, acreditando, piamente, que a violência se restringe naquela carteira surrupiada até com uma certa delicadeza, num elegante e brasileiro pas-de-deux no dono da carteira, eis que o dito corria aos quatro ventos, com a turma da correria.
E fui dormir o sono dos justos. Sonhar é preciso!
Acordei às 5 horas da manhã com um tiro tinindo no meu quarto, tirando uma lasca do meu Super Pentium 4 2.0 que só sobreviveu porque naquele estado que fiquei com o pega ladrão, esqueci o pinico da minha vó bem em frente à telinha (que, de tanto medo de balas perdidas, sequer vai ao banheiro) e o pobre pinico pagou o pato.
Enfim... nada como um pinico, mesmo vazio, limpinho e furado, como uma metáfora do que pode acomodar nas suas dependências... pois é assim que eu me sinto, não podendo botar a boca no trombone num tremendo pega-ladrão, diante da sangria diária que fazem nos meus bolsos de cidadã, que paga, paga, paga e recebe como troco a inércia, o comodismo daqueles que deveriam, por fidúcia pública, defender minimamente os menos favorecidos, com projetos efetivos na busca do equilíbrio social único caminho para desformentar esta violência urbana e brutal (e não num blábláblá pra boi dormir e clipe para o jornal das oito).
Não sei porque lembrei da linha amarela e da linha vermelha que inventaram no Rio de Janeiro. Até onde percebo nem a cor nem a linha deram certo. Mas não custa tentar uma outra linha em Brasília. Quem sabe uma...deixa ver a cor... pensando... hum... qual a cor da coerência de atitudes, de discursos e de promessas, nesta violência sub-reptícia? Marrom glacê?
Sei lá.
No entanto, sou teimosa (isso sei que sou), amo e confio desmesuramente neste meu país (apesar das linhas). Hoje à noite vou ficar debaixo da mesa, confiante, quem sabe ouço novamente um doce, amigo e inocente: pega-ladrão.
É... Sonhar é preciso!

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