Por Arnaldo
Jabor
Na
hora de cantar, todo mundo enche o peito nas boates e gandaias,
levanta os braços, sorri e dispara: “...eu sou de ninguém, eu sou
de todo mundo e todo mundo é meu também...”
No
entanto, passado o efeito da manguaça com energético, e dos beijos
descompromissados, os adeptos da geração tribalista se dirigem aos
consultórios terapêuticos, ou alugam os ouvidos do amigo mais
próximo e reclamam de solidão, ausência de interesse das pessoas,
descaso e rejeição.
A
maioria não quer ser de ninguém, mas quer que alguém seja seu.
Beijar na boca é bom? Claro que é! Se manter sem compromisso, viver
rodeado de amigos em baladas animadíssimas é legal? Evidente que
sim. Mas por que reclamam depois?
Será
que os grupos tribalistas se esqueceram da velha lição ensinada no
colégio, de que toda ação tem uma reação? Agir como tribalista
tem consequências, boas e ruins, como tudo na vida.
Não
dá, infelizmente, para ficar somente com a cereja do bolo - beijar
de língua, namorar e não ser de ninguém. Para comer a cereja, é
preciso comer o bolo todo e, nele, os ingredientes vão além do
descompromisso, como: não receber o famoso telefonema no dia
seguinte, não saber se está namorando mesmo depois de sair um mês
com a mesma pessoa, não se importar se o outro estiver beijando
outra, etc, etc, etc.
Embora
já saibam namorar, os tribalistas não namoram. "Ficar"
também é coisa do passado. A palavra de ordem hoje é “namorix”.
A pessoa pode ter um, dois e até três namorix ao mesmo tempo.
Dificilmente está apaixonada por seus namorix, mas gosta da
companhia do outro e de manter a ilusão de que não está sozinho.
Nessa nova modalidade de relacionamento, ninguém pode se queixar de
nada.
Caso
uma das partes se ausente durante uma semana, a outra deve fingir que
nada aconteceu, afinal, não estão namorando. Aliás, quando foi que
se estabeleceu que namoro é sinônimo de cobrança? A nova geração
prega liberdade, mas acaba tendo visões unilaterais. Assim, como só
deseja a cereja do bolo tribal, enxerga somente o lado negativo das
relações mais sólidas. Desconhece a delícia de assistir a um
filme debaixo das cobertas num dia chuvoso comendo pipoca com
chocolate quente, o prazer de dormir junto abraçado, roçando os pés
sob as cobertas, e a troca de cumplicidade, carinho e amor.
Namorar
é algo que vai muito além das cobranças. É cuidar do outro e ser
cuidado por ele, é telefonar só para dizer boa noite, ter uma boa
companhia para ir ao cinema de mãos dadas, transar por amor, ter
alguém para fazer e receber cafuné, um colo para chorar, uma mão
para enxugar lágrimas, enfim, é ter alguém para amar.
Já
dizia o poeta que amar se aprende amando. Assim, podemos aprender a
amar nos relacionando. Trocando experiências, afetos, conflitos e
sensações. Não precisamos amar sob os conceitos que nos foram
passados. Somos livres para optarmos.
E
ser livre não é beijar na boca e não ser de ninguém. É ter
coragem, ser autêntico e se permitir viver um sentimento... É
arriscar, pagar para ver e correr atrás da tão sonhada felicidade.
É doar e receber, é estar disponível de alma, para que as
surpresas da vida possam aparecer. É compartilhar momentos de
alegria e buscar tirar proveito até mesmo das coisas ruins. Ser de
todo mundo, não ser de ninguém, é o mesmo que não ter ninguém
também... É não ser livre para trocar e crescer... É estar fadado
ao fracasso emocional e à tão temida solidão... Seres humanos são
anjos de uma asa só, para voar têm que se unir ao outro.
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